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quinta-feira, 13 de dezembro de 2012

O reflexo de Jane

Manhã de sol, céu claro e aberto, Jane levantou-se da cama e foi até o banheiro que ficava no final do corredor. Irritou-se como sempre com a luz do sol batendo no espelho, ela sentia que suas espinhas, cravos e outras anomalias da adolescência ficavam realçadas e mais visíveis.Sentia-se feia ao ver seu reflexo e baixar seus olhos cor de mel, (que sempre tentavam esconder a sua insegurança e seu medo), pelo seu corpo e perceber que não era o tipo de garota que que atraía olhares dos garotos legais. Era muito alta e magra, pernas finas, pouco busto, "um desastre da natureza", era assim que achava-se.Jane sentia que eles a ignoravam por não a acharem bonita e por não parecer legal como suas amigas ou como as outras garotas da escola.
No café pensando na sua festa de formatura da 8º série, que seria no final do mês,atrapalhou-se como normalmente acontecia e derrubou café na sua camiseta, sua mãe, dona Elaine, uma senhora não tão senhora assim, se a chamavam assim era por respeito, depois de esbravejar: " O menina atrapalhada que não tem jeito", entregou-lhe um pano úmido e um espelhinho, que sempre carregava consigo  para limpar o café da camiseta e o que escorreu pela boca e pescoço. O espelho foi negado por Jane, que sempre tentava evitar de olhar-se em qualquer espelho que fosse, só o usava quando indispensável, para arrumar-se para  escola, por exemplo.
No caminho de casa até a escola não conseguia pensar em qualquer outra coisa que fosse além da formatura, escolhia o vestido, trocava-o por outro, pensava no que calçaria, como arrumaria seu cabelo, e no pouco tempo que tinha para tantos detalhes. Mas o que realmente não saía da sua cabeça, que era coberta por longos e finos cabelos negros, ou melhor quem, era Renan, um garoto da sua escola, do segundo ano, que Jane sabia que estaria presente na festa.
Renan, não era bonito, nem feio, tinha charme e papo, como as outras garotas diziam, era isso que o tornava atraente e cobiçados pelas demais garotas.Mas Jane via mais nele, mais do que seus olhos   verdes envolventes e seu porte atlético, ela sabia que ele tocava violino e gostava de poesias.
Um dia voltando do seu curso trombou com ele, que deixou cair de uma das mãos  uma pasta azul transparente, ela abaixou-se para pegar, enquanto seu coração tentava sair pela boca e viu que havia alguns textos e poesias dentro dela, ao levantar-se e encontrar os olhos dele esperando os dela, conseguiu balbuciar um desculpa e dar um sorriso sem graça e deformado, só conseguiu reparar na maleta do violino na sua outra mão e segurar-se para não vomitar todo o almoço, só conseguia pensar em como ele deveria estar achando-a uma idiota.Foi a única vez até então que "falou" com Renan ou que conseguiu chegar tão perto dele.
Chegando na escola Jane correu para as suas amiga, Léia e Ana, contando seus planos  e suas expectativas para a formatura, queria estar perfeita, queria que os outros a achassem bonita, pelo menos uma noite que fosse, queria receber elogios dos garotos, já estava cansada dos que recebia da  família, para ela, eles não não significavam nada, achava que o faziam por pena ou por obrigação, Jane queria sentir-se desejada, bonita, será que era pedir muito?
Léia e Ana sabiam da sua paixão platônica por Renan, por isso a encorajaram a declarar-se  a ele, dizer o que sentia, fazer com que ele soubesse da sua existência, fazer-se presente e não tentar esconder-se dele como sempre tentava fazer nas oportunidades que tinha para aproximar-se dele.De início relutou um pouco com a ideia, mas depois, já em casa, começou sentir-se tão bem  ao  imaginar-se frente a frente com ele,olhando no seus olhos, sentindo o seu perfume, poder estar tão tão perto dos seus lábios, nunca havia beijado, como deveria ser?Levantaria o pé como nos filmes? Saberia o que fazer? Mesmo que fosse para dar tudo errado só para estar um pouco perto dele, valeria a pena o vexame que provavelmente sentia que iria pagar contando a ele o que sentia.
Véspera da formatura, Jane mal conseguiu dormir a noite, faria a última prova do vestido na costureira, sentia seu estômago embrulhar. Lavou o rosto, escovou os dentes, arrumou o cabelo, tudo sem olhar-se no espelho, não queria sentir-se mal, queria tentar apagar da mente todas as coisas nela que a irritavam, só assim sem pensar em nada conseguiria ter coragem para fazer o que havia decidido.
Ao ver-se dentro dentro do vestido não segurou as lágrimas, era tudo aquilo que sonhou, azul escuro,comprimento acima dos joelhos, todo feito de seda, a saia era balonê, justo na cintura, tomara que caia, realçava seus pequenos seios, sua cintura, a sua alva pele,era um sonho para qualquer menina de 14 anos, mas para Jane significava poder ser por uma noite o que desejava ser todos os dias ao olhar-se no espelho.
Antes de dormir decidiu que se arrumaria no dia seguinte sem olhar-se nele, só assim sentiria-se capaz para declarar-se a Renan, precisava estar bem com a sua alta estima e toda vez que via seu reflexo sentia-se ridícula e horrível com aquelas coisas na sua pele, sua cabeça desproporcional ao seu corpo, e aquele nariz? Como poderia ter aquele nariz? Não, se visse tudo aquilo sentaria e começaria a chorar, não poderia deixar isso acontecer.
Enfim, chegou o grande dia, pensou consigo ao abrir os olhos que só conseguiu fechar depois das 4:00 da manhã. No café pediu a sua mãe que a deixasse arrumar-se sozinha, explicou que precisava daquele momento para ela, que seria um dia muito importante e gostaria de poder fazer as coisas de acordo com o seu gosto, sem palpites, por mais que eles viessem na intenção de ajuda-lá, eram coisas que precisava fazer sozinha, era a primeira festa de verdade que ia e precisava dessa experiência e que também gostaria de ir sozinha, era só dois quarteirões, chegar com os país era parecer ainda uma criança, incapaz de poder tomar suas próprias decisões sozinhas, mesmo tendo 14 anos já era hora de começar a ter um pouco mais de autonomia. Dona Elaine ficou pensativa, olhou para o marido que a tudo ouviu em silêncio e fez um sinal afirmativo com a cabeça, mesmo chateada conseguiu sorrir e dizer que tudo bem, que respeitava e aceitava os pedidos dela, que quase nunca pedia alguma coisa.
A entrega dos diplomas começaria ás 19 e a festa seria logo depois, na outra quadra da escola. Jane começou a aprontar-se ás 17, colocou o vestido sobre a mesa, escolheu os brincos, deixou os sapatos de jeito, os acessórios de cabelo que havia comprado, a maquiagem que nunca tinha usado, tomou banhou e começou a produção. O problema é que sem espelho fica um pouco difícil arrumar o cabelo e pior ainda maquiar-se , mas Jane estava decidida em não usá-lo, foi maquiando-se como via suas amigas na escola e as atrizes na televisão, seguindo seu instinto, tentado acertar os contornos das pálpebras e da boca. 
Sua mãe antes de sair bateu na porta, sem abrir disse que estavam indo na frente, que a esperavam na escola, recomendou cuidado, Jane estava tão entretida tentando escolher qual dos dois batons que tinha usaria que mal prestou atenção no que a mãe disse, apenas concordou e disse tchau. Do outro lado Dona Elaine percebeu a indiferença da filha e deixou cair uma lágrima, nisso seu Roberto, aproximou-se, delicadamente enxugou a lágrima da esposa e sussurrou no seu ouvido enquanto a abraçava : "Nossa menina está crescendo".
Finalmente pronta, pensou Jane, sentia-se segura, firme do que iria fazer, nunca havia se sentido tão bem consigo como sentia-se naquele momento, pegou sua bolsa, apagou as luzes e saiu.
Infelizmente as coisas não sairiam como imaginou, chegando na porta da escola, as pessoas começaram a olha-lá e cochichar, Jane pensou que deveria estar muito bonita,  pela primeira vez atraia os olhares das pessoas, sentiu-se mais segura ainda para entrar e falar com Renan. Entretanto, quando entrou na quadra começou ouvir risadinhas, percebeu as pessoas cutucando umas as outras, até que uma garota de longe gritou " Alguém errou o caminho do circo", Jane estava sem entender nada, aquilo era para ela? Porque faziam isso ? Não a queriam lá?
Transtornada correu para o banheiro, entrou em choque ao ver-se no espelho, estava ridícula, não soubera maquiar-se, o blush estava demasiadamente forte, o batom fora do contorno dos lábios,a base em tonalidade diferente da sua pele, a sombra de uma pálpebra mais escura do que da outra, decididamente arrumar-se sem espelho havia sido um terrível erro.
Saiu correndo, chorando, desesperada do banheiro, e o destino que muitas vezes gosta de pregar peças a fez trombar com Renan que havia acabado de chegar , ao olhar para ele não conseguiu disfarçar o espanto, Jane naquele momento queria sumir para todo o sempre, seu conto de fadas acaba antes de começar, só conseguiu ter forçar para empurrá-lo e sair correndo. Seus país de longe a tudo assistiram mas não conseguiram chegar até ela a tempo pelo tumulto que formou-se.
Nem Jane saberia dizer por quanto tempo correu entre soluços e lágrimas, foi até onde as suas forças suportaram, caindo sentada num banco perto de uma praça, só conseguia sentir raiva e uma dor   que vinha do  fundo da sua alma, sentia seu coração oprimido e a sua cabeça latejar, tudo que aconteceu naquele noite vinha como fleshs na sua mente, naquele momento jurou para si mesma que nunca mais olharia em nenhum espelho, estava condenada a ser feia e ridícula para sempre, até aceitava essa sina, mas não queria torturar-se olhando para seu reflexo e lembrando todos os dias do pior dia da sua vida . Um carro parou, eram seus país, haviam horas que estavam rodando de carro no bairro a sua procura, sua mãe ainda atordoada pela preocupação a ergueu nos braços e a levou para dentro do carro, adormeceu antes de chegar em casa.
 Depois do ocorrido recusou-se a voltar a estudar naquela escola, seus país tiveram que mudá-la, cortou contato com todo o mundo, até com suas amigas Léia e Ana que assistiram ao seu vexame sem ajudá-la. Fechou-se no seu mundo e proibiu a todos os seus familiares de dizerem que era bonita ou coisa parecida.
Com a ajuda dos país, que procuraram ajuda psicológica para Jane, ela conseguiu recuperar-se aos pouco,conquistando sua alto estima e sua vida social, foi percebendo que a adolescência é uma fase transitória e que as mudanças estão sempre presentes na vida. Depois de algum tempo de tratamento já conseguia olhar-se no espelho sem tanto pavor, tomando como lição para si que o nunca não dura para sempre.
Depois de algum tempo, por acaso, viu Renan acompanhado por Léia e Ana, suas antigas amigas sentadas no mesmo banco onde ela havia estado na noite da formatura, eles ficaram a olhá-la enquanto ela ergueu a cabeça, olhou para frente e continuou caminhando.